Setembro Amarelo – A valorização da Vida

A campanha Setembro Amarelo foi criada no Brasil  em 2015 pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) com o objetivo de prevenir  e reduzir o número de mortes por lesões autoprovocadas. O dia 10 deste mês é o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, mas a campanha ocorre durante todo o ano.

A origem da ação se deu em 1994, nos Estados Unidos, com o suicídio do jovem Mike Emme, que possuía um veículo Ford Mustang ano 1968 na cor amarela. No funeral, os pais e amigos decidiram distribuir cartões e fitas amarelas com a frase “Se precisar, peça ajuda”. Essa atitude iniciou um movimento de prevenção ao suicídio no país e a fita amarela se tornou símbolo da campanha.

O assunto ainda é um tabu para muitas pessoas, o que torna mais difícil a identificação dos sinais, a oferta e a busca por ajuda. A taxa de mortes por lesões autoprovocadas tem aumentado nos últimos anos e um dos fatores que têm impulsionado essa taxa é a interação nas mídias sociais. O uso intenso dessas redes, relacionado a fatores como o sentimento de isolamento da vida real, aumento da percepção de felicidade e sucesso alheio, cyberbullying e fake news podem contribuir para o aumento do desenvolvimento de transtornos mentais. Ademais, a forma de abordar o suicídio em mídias, por meio de publicações de notícias e imagens, precisa ser cuidadosa para evitar um efeito imitativo e contagioso, também conhecido como Efeito Werther.

 

Suicídio no Brasil

As mortes por lesões autoprovocadas são consideradas um problema de saúde pública no Brasil e é de extrema importância a elaboração e o fortalecimento de políticas públicas de prevenção ao suicídio. Em 2001, foi instituída a Política Nacional de Saúde Mental, que busca dar auxílio às pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial à saúde mental.  E no ano de 2019 foi sancionada a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, a primeira legislação com ações e estratégias de responsabilidade com cooperação entre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, com estratégias voltadas à prevenção de violências autoprovocadas.

Os dados sobre mortes no Brasil estão disponíveis para consultas no DATASUS. No caso do suicídio, a causa do óbito é informada como “lesão autoprovocada”. Dado esse contexto, as análises a seguir foram feitas considerando estes dados disponibilizados, bem como as estimativas populacionais disponibilizadas anualmente pelo IBGE. É importante ressaltar que as informações consolidadas estão disponíveis até o ano de 2019. O Gráfico 1 mostra a evolução de suicídios no Brasil entre os anos de 2012 e 2019.

Gráfico 1: Número de suicídios por ano em cada região no Brasil (entre 2012 e 2019)

Número de suicídios por ano Brasil

Cálculo: (número de suicídios x 10000) / estimativa populacional

Um fenômeno importante de analisar é a evolução no número de mortes da região Sul. Historicamente, o estado do Rio Grande do Sul possui um índice superior em relação à todo país, conforme indica o Boletim de Vigilância Epidemiológica de Suicídio e Tentativa de Suicídio de 2018 do governo do estado.

Uma das hipóteses para o índice elevado das taxas nesta região relaciona o fenômeno com o uso indiscriminado de pesticidas manganês. Segundo declaração da diretora do departamento de Doenças e Agravos Não Transmissíveis do Ministério da Saúde, Fátima Marinho, a substância causa danos ao sistema nervoso central.

Neste mês de setembro, a perita criminal Maria Cristina Franck (IGP-RS) declarou ao G1 que: Esse problema é real, está acontecendo, mesmo que as pessoas se sintam constrangidas de compartilhar, mas é importante que as famílias ouçam e saibam onde procurar auxílio. Existem serviços de acolhimento com atividades físicas e sociais direcionadas a esse público, só que muitas vezes não sabem onde buscar esse recurso”. 

O Gráfico 2 mostra que o sexo masculino tem números significativamente maiores do que o feminino em todas as regiões do país relacionados com ocorrências de suicídios. Em 2017, o Hospital Santa Mônica divulgou um artigo sobre depressão masculina, onde cita diversos aspectos sobre tendências que os homens têm que dificultam a identificação e tratamento de depressão, podendo ocasionar suicídios. Neste sentido, devemos ressaltar que a construção social de que homens não podem ter problemas de saúde, não ficam doentes e não precisam de ajuda, precisa ser desconstruída para que possamos salvar mais vidas.

Gráfico 2: Ocorrências de suicídio a cada 100 mil habitantes por região no Brasil  (entre 2012 e 2019)

Ocorrências de suicídio Brasil

Cálculo: (número de suicídios x 100000)  / estimativa populacional

Suicídio no mundo

Em junho de 2021 foi divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) um material (Suicide worldwide in 2019) que busca expor os dados sobre suicído atualizados ao redor do mundo, bem como um guia de medidas que busca reduzir o número de casos até 2030.

As taxas de suicídio caíram nos últimos 20 anos em 36%, mas na região das Américas as taxas aumentaram 17% no mesmo período. Embora muitos países tenham dado maior importância à prevenção, muitos não se comprometeram com políticas públicas de prevenção. É necessária uma aceleração na redução dos suicídios para cumprir a meta de redução de um terço da taxa global até 2030 proposta pela OMS.

No Gráfico 3, fornececido pela OMS, podemos notar que no Brasil ocorrem entre 5 e 9,9 mortes a cada 100 mil habitantes causadas por suicídio:

Gráfico 3: Taxas de suicídio padronizadas por idade (por 100.000 habitantes) em 2019

 

Taxas de suicídio padronizadas por idade

Fonte: WHO Global Health Estimates 2000-2019

O Gráfico 3 também mostra dados de ambos os sexos, destacando que o Brasil não possui índices tão elevados como outros países, como a Rússia e a África do Sul. Isso revela que os índices variam ao redor do mundo, não estão necessariamente ligados a fatores específicos, como desenvolvimento.

Bullying: O que fazer?

O livro “Mindset: A Nova Psicologia do Sucesso”, de autoria da psicóloga Carol Dweck, afirma o seguinte sobre a prática do bullying: “Os bullies julgam. As vítimas aceitam o julgamento. Às vezes, isso permance dentro delas e pode levar  à depressão e ao suicídio”. Sobre a prática no ambiente escolar, a autora diz que as escolas “aceitam a ideia de que algumas crianças se sintam superiores a outras e se achem no direito de atormentar a quem quer que seja”.

Carol Dweck ainda cita exemplos de escolas que reduziram drasticamente os índices de bullying físico e provocações colocando em prática um programa anti-bullying a partir das pesquisas de Dan Olweus. O programa “ajuda os bullies a se transformarem, ajuda as vítimas e empodera os espectadores para intervir em auxílio delas”.

Relatos de superação

Além das informações baseadas em dados de instituições do Brasil e do mundo, gostaríamos de trazer relatos de pessoas que sobreviveram a tentativas de suicídio e que, após a recuperação, buscaram ajudar outras pessoas com suas próprias experiências. Os artigos “A depressão pelos olhos de quem já teve a doença” da revista Veja e “Setembro Amarelo: conheça histórias de pessoas que superaram a depressão” da Secretaria da Saúde do Ceará, trazem diversos relatos.

Além desses artigos, existem outras entrevistas que mostram pessoas que tiveram apoio, tratamento médico e psicológico adequados e que tiveram uma segunda chance. Importante destacar que essas pessoas não se arrependem de ter essa oportunidade:

“Eu ia me matar porque não acreditava que existisse outra forma de escapar do desespero que estava sentindo. Mas falar sobre o problema me levou para outra direção. Agora sei que é possível superar impulsos suicidas. Esta é a mensagem que precisamos urgentemente disseminar na sociedade.” – Jonny Benjamin em entrevista para a BBC.

 

Redes de apoio

A prevenção do suicídio requer o esforço de todos: família, amigos, colegas de trabalho, membros da comunidade, educadores, líderes religiosos, profissionais de saúde, funcionários públicos e governos. Além disso, requer estratégias integrativas que englobam o trabalho no nível individual, de sistemas e da comunidade.

O Instituto de Pesquisa, Prevenção e Estudos em Suicídio (IPPES) é resultado do encontro de pesquisadores e atores da sociedade civil engajados na prevenção do suicídio e acreditamos que seja dever de todos. A prevenção e a posvenção (todo cuidado prestado aos sobreviventes enlutados por um suicídio) englobam informação, conhecimento e compromisso social. Nosso lema é conhecer para prevenir.

Temos também o Centro de Valorização da Vida (CVV) que dá suporte telefônico a partir do número 188.

 

Autor: Julio Cesar São Pedro

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